Como uma moeda, uma peça de dominó ou até uma carta, também a Internet tem duas facetas e, como sabemos, nem sempre tudo é cor-de-rosa. Um dos aspetos mais perigosos no que toca a atentados à saúde mental nos dias de hoje é, precisamente, a comparação que fazemos entre a nossa vida e o que vemos online. Estar consciente de que nem tudo o que consumimos é real e que não existem vidas perfeitas é o primeiro passo para nos podermos proteger de comparações malignas.
Na realidade, a comparação sempre existiu, as redes sociais apenas a vieram intensificar. Do latim comparare, este verbo transitivo significa, de acordo com o dicionário: confrontar uma coisa com outra para lhe determinar diferença, semelhança ou relação. Neste caso, falamos da comparação autodestrutiva que muitas vezes estabelecemos, ainda que inconscientemente, entre nós mesmos e as pessoas que nos aparecem na tela. Agora que clarificamos o que é comparar, está na altura de perceber o porquê deste ser um caminho evitável.
Tal como “os homens não se medem aos palmos”, também nenhum ser humano se mede em relação aos outros. Se viemos todos ao mundo em circunstâncias diferentes, como pessoas diferentes, cada um com as suas características, costumes e hábitos também eles diferentes, não é normal que as nossas vidas sejam todas, à partida, diferentes? É que este facto não faz delas melhores ou piores, fá-las só isso: diferentes.
Outra questão fundamental é (e perdoem-me o spam de provérbios mas é mais forte que eu), a ideia de: quem vê caras não vê corações e por isso quem vê stories também não vê lutas. Quantas vezes não foram publicadas fotografias incríveis em dias horríveis? Muitas. Só porque a pessoa partilha uma foto divina a curtir o carnaval no Rio, não quer dizer que não tenha passado mal a noite com saudades de uma pessoa que já cá não está. Só porque publica um vídeo a fazer o que mais gosta não significa que não tenha tido um último mês exaustivo no trabalho e esteja perto de um burnout. Como estes, há milhares de outros exemplos e escrevo-os com o objetivo de reforçar que a vida no Instagram ou no TikTok é apenas um pedaço de realidade. As pessoas só vão ver o que eu quiser que elas vejam e, frequentemente, as batalhas interiores e a parte menos brilhante da vida são quotas que só se mostram offline.
Apesar de serem cada vez mais os criadores que tentam espelhar ao máximo um conteúdo de vida real (pense-se, por ex., na trend da “galeria de uma pessoa normal”), a verdade é que ninguém é obrigado a mostrar tudo e os momentos menos bons tendemos a guardar para nós.
Por este motivo, é importante ter sempre assente que o digital não é a vida toda. O digital não é um dia inteiro, são momentos dele. Sabendo isso, neste caminho de aprendizagem e coexistência online, evitar as comparações excessivas e promover a empatia são as direções que se devem considerar.
Beatriz Fernandes
Aluna do 2º ano de Ciências da Comunicação na FLUP e Bolseira Gulbenkian
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